Os efeitos da resilição unilateral antecipada do contrato quando a outra parte houver realizado investimentos consideráveis para executar seu objeto
Ainda que sem perceber, estamos, cotidianamente, sujeitos a contratos. Em nossas casas, serviços essenciais, como fornecimento de água ou energia elétrica, são prestados sob o regramento de disposições contratuais. Da mesma forma, quando adquirimos um produto ou chamamos um Uber, figuramos como partes de uma relação contratual. No meio empresarial não é diferente. São os contratos que, ao regularem o acordo de vontades dos envolvidos, dão movimento às atividades econômicas, sendo capazes de criar, modificar ou extinguir direitos. A autonomia privada, aliás, foi deveras prestigiada com a promulgação da Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019), que expressamente estabeleceu como mínima e excepcional a intervenção do Estado. Por razões diversas, inclusive resultantes da mutabilidade e dinamismo das relações, os contratos por vezes não perduram pelo tempo que havia sido predefinido pelas partes, sendo extintos antecipadamente de modo consensual. Em outras situações, contudo, a decisão de encerrar a relação de forma prematura é unilateral, ou seja, advinda de apenas um dos contratantes. Nesses casos, muitos são os questionamentos daquele que, dada a natureza do contrato, realizou investimentos consideráveis visando executar seu objeto, notadamente com a legítima expectativa de recuperá-los ao longo do período combinado, além de, por óbvio, auferir lucro. Prevendo hipóteses como essa, o legislador estabeleceu no parágrafo único do artigo 473 do Código Civil que, apesar da possibilidade de resilição imotivada por uma das partes, tal ato apenas surtirá efeitos após transcorrido prazo compatível com a natureza e vulto dos investimentos realizados pela outra. Com base nesse artigo, aliás, em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu ter havido abuso de direito por uma operadora de planos de saúde ao romper precocemente o contrato firmado com duas empresas de telemarketing, sem observar prazo razoável para que elas pudessem recuperar os elevados investimentos realizados para cumprir as obrigações assumidas. Por conta disso, a operadora foi condenada a indenizar as empresas de telemarketing (Recurso Especial nº 1.874.358). Não obstante referida previsão legal, importante salientar que, como visto, o legislador não adotou critérios fechados para delimitar seu alcance, de forma que é imprescindível a análise do caso concreto para avaliar sua aplicabilidade.