Gomes Valente & Roch – Advogados

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A empreitada por preço global e possível aumento do valor por alteração de projeto

Por meio do contrato de empreitada, é possível a contratação de empreiteiro, a fim de que este apenas execute uma obra (empreitada de mão de obra ou de lavor) ou, além disso, forneça os materiais necessários para o empreendimento (empreitada mista), a depender do que for previamente ajustado entre as partes. Tal contrato possui diversos aspectos polêmicos, que devem ser detidamente analisados em cada caso concreto, haja vista as diversas formas possíveis de contratação. No presente artigo, contudo, pretende-se discorrer, especificamente, sobre a empreitada por preço global de obra privada, posto que os contratos públicos são disciplinados por legislação específica e, em razão disso, possuem outros aspectos que também merecem ser observados. Dito isso, importante destacar que a empreitada por preço global é aquela na qual o empreiteiro é contratado apenas para executar a obra, ou para executar a obra e fornecer materiais, em qualquer dos casos, por um preço certo, total e previamente definido. A grande vantagem desse tipo de contratação, obviamente, é proteger o dono da obra contra eventuais abusos praticados pelo empreiteiro, que poderia pretender aumentar valores e quantidades de forma unilateral. Contudo, será que, realmente, na empreitada por preço global, o valor contratado jamais poderá sofrer qualquer aumento? A resposta é negativa. Isso porque, em que pese, de fato, como regra geral e para benefício do contratante, o valor não possa ser reajustado, há a hipótese na qual o próprio dono da obra dá causa ao aumento de preço. Essa situação acontece, por exemplo, quando há a alteração de projetos, durante a execução do empreendimento, que resulte em verdadeira expansão da obra ou aumento da complexidade dos serviços prestados. Inclusive, o art. 619 do Código Civil, ao tratar sobre o contrato de empreitada, é taxativo ao estabelecer duas hipóteses nas quais as alterações no projeto, que resultem em acréscimo no preço, deverão ter seus custos arcados pelo contratante, quais sejam: a)     quando as alterações forem escritas pelo contratante, pois, nesse caso, comprova-se que as modificações são decorrentes de instruções feitas pelo dono da obra; e b)     quando, ainda que não estejam escritas, as alterações forem de conhecimento do dono do empreendimento, o qual, sempre presente à obra, não podia ignorar o que estava ocorrendo e nunca protestou, pois, nesse caso, presume-se a ciência sobre a expansão do empreendimento e o aumento dos custos. Tais hipóteses são extremamente interessantes, pois, apesar de a lei permitir certa proteção ao contratante, também visa proteger o próprio empreiteiro contra abusos praticados pelos donos de obras ao longo da execução do contrato. Sequer poderia ser diferente, posto que o verdadeiro espírito da lei é impedir a obtenção de vantagem indevida por qualquer das partes. Por isso, considerando todas as peculiaridades que envolvem esse tipo de contratação, há necessidade de que cada caso concreto seja analisado por um advogado de sua confiança.

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Novas regras de teletrabalho estabelecidas pela Lei 14.442/2022

O teletrabalho vinha sendo adotado no Brasil de maneira lenta e difusa, até que fomos surpreendidos pela pandemia da Covid-19, que levou o mundo a um drástico isolamento social proveniente da necessidade de evitar a propagação do coronavírus e, por consequência, compulsoriamente, migrou a população para o trabalho à distância.  Não há dúvida, portanto, de que a pandemia potencializou e multiplicou a adesão das atividades laborais exercidas remotamente nos últimos dois anos, mesmo havendo lacunas na legislação para esta modalidade de expediente.  À vista disto, para suprir estas necessidades, em 05/09/2022 foi publicada a Lei nº 14.442/2022 que estabelece novas regras, definindo o teletrabalho, ou trabalho remoto, como toda a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, que, por sua natureza, não configure trabalho externo.  Para as empresas, é importante destacar que a referida Lei determina que o empregador não será responsável pelas despesas eventualmente necessárias ao retorno presencial, na hipótese de o empregado optar por realizar o trabalho remoto fora da localidade prevista no contrato.  Define, ainda, que qualquer trabalhador poderá prestar este regime de labor, inclusive estagiários e aprendizes, devendo ser formalizado, contudo, contrato individual nestes termos. Os empregadores, entretanto, deverão conferir prioridade na adoção desse regime aos empregados com deficiência e àqueles com filho ou criança sob guarda judicial, até quatro anos de idade.  Além disso, a prestação de serviços poderá ser realizada mediante jornada, produção ou tarefa. No caso de contrato de trabalho por produção ou tarefa, não será aplicado o capítulo da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) que trata da duração do labor e que prevê o controle de jornada. Esse controle também não será obrigatório aos contratos por jornada quando a empresa possuir menos de vinte empregados. Já para as empresas com mais de vinte trabalhadores, a anotação de horários, na hipótese de trabalho por jornada, é obrigatória.  Relevante suscitar, também, que a Lei determina que não constitui tempo à disposição do empregador, e nem mesmo regime de prontidão ou de sobreaviso, o uso de infraestrutura, equipamentos digitais, softwares, ferramentas digitais e aplicações de internet, pelo empregado, fora da jornada, exceto se houver previsão em acordo, individual ou coletivo, ou convenção coletiva nesse sentido.  À primeira vista pode parecer simples a adaptação a esta forma de trabalho, mas, como quase tudo na vida, tem seus prós e contras. De todo o modo, empregadores e empregados podem aproveitar ao máximo a economia de custos e demais vantagens desta modalidade.  Importante salientar, porém, que, para executar este modelo de ofício, é fundamental haver confiança e disciplina entre as partes envolvidas. Somente com a conjunção desses fatores haverá um trabalho à distância bem-sucedido.  Por esta razão, destaca-se a necessidade de cuidados para a adoção do labor remoto, bem como a elaboração de um contrato individual de trabalho bem consignado, adequado à nova norma, a fim de evitar, principalmente, passivos trabalhistas a longo prazo.

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Os efeitos da resilição unilateral antecipada do contrato quando a outra parte houver realizado investimentos consideráveis para executar seu objeto

Ainda que sem perceber, estamos, cotidianamente, sujeitos a contratos. Em nossas casas, serviços essenciais, como fornecimento de água ou energia elétrica, são prestados sob o regramento de disposições contratuais. Da mesma forma, quando adquirimos um produto ou chamamos um Uber, figuramos como partes de uma relação contratual. No meio empresarial não é diferente. São os contratos que, ao regularem o acordo de vontades dos envolvidos, dão movimento às atividades econômicas, sendo capazes de criar, modificar ou extinguir direitos. A autonomia privada, aliás, foi deveras prestigiada com a promulgação da Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019), que expressamente estabeleceu como mínima e excepcional a intervenção do Estado.  Por razões diversas, inclusive resultantes da mutabilidade e dinamismo das relações, os contratos por vezes não perduram pelo tempo que havia sido predefinido pelas partes, sendo extintos antecipadamente de modo consensual. Em outras situações, contudo, a decisão de encerrar a relação de forma prematura é unilateral, ou seja, advinda de apenas um dos contratantes. Nesses casos, muitos são os questionamentos daquele que, dada a natureza do contrato, realizou investimentos consideráveis visando executar seu objeto, notadamente com a legítima expectativa de recuperá-los ao longo do período combinado, além de, por óbvio, auferir lucro. Prevendo hipóteses como essa, o legislador estabeleceu no parágrafo único do artigo 473 do Código Civil que, apesar da possibilidade de resilição imotivada por uma das partes, tal ato apenas surtirá efeitos após transcorrido prazo compatível com a natureza e vulto dos investimentos realizados pela outra. Com base nesse artigo, aliás, em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu ter havido abuso de direito por uma operadora de planos de saúde ao romper precocemente o contrato firmado com duas empresas de telemarketing, sem observar prazo razoável para que elas pudessem recuperar os elevados investimentos realizados para cumprir as obrigações assumidas. Por conta disso, a operadora foi condenada a indenizar as empresas de telemarketing (Recurso Especial nº 1.874.358). Não obstante referida previsão legal, importante salientar que, como visto, o legislador não adotou critérios fechados para delimitar seu alcance, de forma que é imprescindível a análise do caso concreto para avaliar sua aplicabilidade.

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Qual a finalidade de se constituir uma Sociedade de Propósito Específico (SPE)?

O objeto social de uma SPE (Sociedade de Propósito Específico), como já indica o seu nome, deve ser específico e determinado, e em geral, elas possuem atividade restrita e prazo de existência determinado. Não há a necessidade de uma delimitação temporal, mas a razão de sua existência é o cumprimento desse propósito específico, findo o qual ela será extinta. A SPE não é destinada a desenvolver uma vida social própria, não sendo um dos tipos societários, e sim tendo sua própria caracterização relacionada unicamente ao objetivo social da sociedade. Como não se trata de um tipo societário autônomo ou um tipo de sociedade mercantil, deve ser constituída através de um dos modelos societários já existentes, seja uma sociedade limitada (Ltda.) ou uma sociedade anônima (S/A). As SPEs são utilizadas para a realização dos mais variados tipos de projetos, grandes e pequenos, como, por exemplo, na construção de redes de transmissão, recuperação judicial de empresas, usinas elétricas, empreendimentos imobiliários, loteamentos e projetos de Parceria Público-Privada (PPP). No caso da utilização para fins de incorporação imobiliária, por exemplo, constitui-se a SPE para a realização do empreendimento, e, após a efetiva entrega das unidades autônomas, a SPE é descontinuada. Dentre as vantagens da utilização de SPEs, encontra-se a facilitação do planejamento fiscal e tributário. A empresa pode optar pelo regime de tributação que seja mais favorável ao negócio, pois, ao constituir a SPE, não é necessário que se siga o regime já utilizado pela empresa. Ademais, como a SPE possui personalidade jurídica própria e total independência patrimonial, ela permite a segregação de riscos e ativos das demais entidades, sócios e atividades envolvidas nos projetos que se busca concluir, sendo que ela isola o patrimônio dos projetos do patrimônio da empresa, evitando diversos riscos e danos. Dentre suas peculiaridades, cabe destacar que a SPE não pode ser filial ou agência, participar do capital social de outra pessoa jurídica, ou mesmo ser transformada de qualquer tipo jurídico em SPE, ou vice-versa, em razão de sua finalidade. Ainda assim, as vantagens de facilitação tributária, proteção do patrimônio das empresas e de seus sócios, aliada a diminuição de riscos e o fato da SPE ser totalmente livre de pendências de débitos fiscais que possam existir, têm sido um grande atrativo para muitas empresas que visam realizar projetos específicos.

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Patrimônio de afetação como proteção da atividade empresarial em execuções

Com a falência de uma das maiores construtoras do Brasil, em 1999, o legislador viu a necessidade de regulamentar a incorporação imobiliária para aumentar a segurança jurídica na atividade, protegendo os promitentes compradores das unidades imobiliárias e a própria atividade empresarial. Nesse sentido, foi criado em 2001, pela a medida provisória n. 2.221, o Patrimônio de Afetação, alterando a Lei 4.591/64, para resguardar os promitentes compradores de unidades autônomas dos empreendimentos imobiliários e garantir a efetividade das incorporações. Em 2004, a Lei 10.931/04 melhor regulamentou o instituto, dando, também, nova redação a alguns dispositivos já presentes. O patrimônio de afetação consiste na segregação do terreno, bens e direitos vinculados ao patrimônio do incorporador, destinando-o à consecução da incorporação e garantindo as obrigações vinculadas somente ao empreendimento afetado. Ou seja, tem o intuito de “blindar” o patrimônio da incorporação. Integram a afetação patrimonial as receitas provenientes das vendas das unidades, recursos angariados pela incorporadora junto a instituições financeiras ou qualquer montante cujo objetivo seja a concretização da incorporação, limitando-se ao necessário para conclusão da obra. A opção pelo patrimônio de afetação é faculdade do incorporador imobiliário e pode ser implementada a qualquer tempo. Além de ser método para proteger a incorporação em face de execuções contra a incorporadora, concede benefícios tributários àquele que optar pela utilização do instituto, através do Regime Especial de Tributação das Incorporações Imobiliárias. O referido regime especial abrange Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), instituindo alíquota fixa única para recolhimento desse conjunto de tributos sob as receitas mensais recebidas. Não somente, a afetação das incorporações transmite maior segurança jurídica aos clientes promitentes compradores das unidades, tendo em vista a certeza do direcionamento dos valores pagos à consecução do objeto negociado. Assim, tem-se que a afetação patrimonial condiciona o exercício dos poderes do incorporador ao cumprimento da função social e econômica da incorporação, protegendo o patrimônio afetado dos riscos patrimoniais de outros negócios que a incorporadora possa participar e, em casos de execução em face da incorporadora, o conjunto necessário para consecução da atividade empresarial de incorporação imobiliária.

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A inconstitucionalidade do pagamento em dobro das férias quitadas em atraso

 Em demandas trabalhistas, muitas empresas foram condenadas ao pagamento em dobro das férias quitadas em atraso. Isto porque, a Consolidação das Leis do Trabalho estabelece que o empregado tem direito a 30 dias de férias, a cada 12 meses trabalhados, as quais devem ser gozadas nos 12 meses seguintes à data em que o empregado tiver adquirido esse direito. Ademais, em até dois dias antes do período concessivo de férias, a empresa precisa pagar ao empregado a remuneração como se tivesse trabalhado, com o acréscimo constitucional de 1/3 do valor.Em 2014, o TST editou a Súmula 450, que passou a estabelecer:“É devido o pagamento em dobro da remuneração de férias, incluído o terço constitucional, com base no art. 137 da CLT, quando, ainda que gozadas na época própria, o empregador tenha descumprido o prazo previsto no art. 145 do mesmo diploma legal”.

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A cláusula de Take or Pay nos contratos de longo prazo

“Take or Pay” é uma disposição contratual que define uma quantidade mínima de produtos ou serviços a serem disponibilizados, enquanto fixa um valor mínimo a ser pago por tais produtos ou serviços, independentemente de terem sido usufruídos em sua totalidade. Nesta acepção, quando bem adequada ao instrumento contratual, a cláusula de Take or Pay (na sigla, “ToP”) pode beneficiar tanto a parte contratante quanto a contratada, ao compartilhar de forma equilibrada os riscos e reduzir os custos da operação, proporcionando maior segurança. Este mecanismo, que já é amplamente utilizado por companhias fornecedoras de energia elétrica, gás e telefonia, por exemplo, vem ganhando destaque nos últimos anos entre as demais empresas, de diversas áreas de atuação, em especial nas contratações de longo prazo que requerem grande investimento e planejamento. Desta forma, a cláusula de ToP interessa à empresa contratada enquanto garante uma quantidade de demanda, por prazo certo e comumente prorrogável. Através disto, assegura-se remuneração periódica mínima, que custeará o investimento efetuado para possibilitar o atendimento desta demanda. Assim, amplia-se a estabilidade da produção, permitindo racionalização de custos e gestão mais acertada da atividade empresarial. Do mesmo modo, a parte contratante também é favorecida com a segurança de que terá à sua disposição determinados bens ou serviços, com padrões de qualidade satisfatórios, na quantidade necessária, por preços mais estáveis. Os valores poderão ser reajustados, mas de maneira razoável e estabelecida com antecedência, em comum acordo. Prevendo-se a longo termo o valor que será destinado ao custeio do contrato, a parte contratante, igualmente, aprimora sua gestão. Para este objetivo, no intuito de garantir a devida consecução da ToP, é possível que se estipule multa específica à inobservância da cláusula. Ainda, as empresas podem antever solução à demanda consideravelmente inferior ou excedente, delimitando a viabilidade da compensação quantitativa no período posterior.  Não obstante, assinale-se que há liberdade negocial para que as partes reconsiderem as determinações a título de ToP, a qualquer tempo, agindo de boa-fé e cooperando, a fim de restabelecer o equilíbrio da relação comercial se este for obstaculizado. De todo modo, é fundamental a elaboração de instrumento apropriado, que moldará a cláusula de ToP conforme as particularidades da avença comercial, ainda mais quando a relação será por prazo prolongado. Ao final, a quantidade mínima de demanda, a estabilidade da oferta e a longevidade da relação serão incorporadas ao contrato, consolidando uma dinâmica sólida, caracterizada pela bilateralidade dos proveitos.

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O cabimento da multa compensatória por devolução de imóvel locado em razão de ordem judicial de despejo

Não é estranho, em contratos, as partes pactuarem cláusula penal compensatória, em caso de inadimplemento contratual por parte de qualquer um dos contratantes, como forma de garantia do cumprimento das obrigações assumidas contratualmente. Em contratos de locação de imóvel urbano, o artigo 4º da Lei 8.245/91, que disciplina esse tipo de locação, permite às partes estabelecerem multa compensatória, na hipótese do imóvel locado vir a ser devolvido pelo locatário antes do término do prazo de locação previsto no contrato:  “Art. 4º Durante o prazo estipulado para a duração do contrato, não poderá o locador reaver o imóvel alugado. Com exceção ao que estipula o § 2o do art. 54-A, o locatário, todavia, poderá devolvê-lo, pagando a multa pactuada, proporcional ao período de cumprimento do contrato, ou, na sua falta, a que for judicialmente estipulada”. Assim, o locatário pode devolver o imóvel ao locador, antes de decorrido o prazo de locação acordado, mediante o pagamento da multa contratual pactuada, com o abatimento proporcional do valor pelo período do contrato que restava a ser cumprido. Resta saber, contudo, se a multa compensatória é devida apenas no caso de devolução voluntária do imóvel ou se é aplicável, também, nos casos que a devolução ocorre de maneira forçada, em razão de ordem judicial que decreta o despejo do locatário. Nesse aspecto, a Lei do Inquilinato dispõe que a locação pode ser desfeita em caso de infração contratual, à exemplo do locatário inadimplente, que descumpre o seu dever de pagar o aluguel no tempo e modo devidos. Partindo dessa premissa, a lei permite que o locador se valha de medidas judiciais para cobrar os alugueis em atraso e os que se vencerem, além de igualmente possibilitar o despejo do locatário inadimplente. Uma vez deferido o despejo, o locatário é obrigado a devolver o imóvel ao locador, tão logo tenha recebido o mandado de intimação, que conterá o prazo de 30 (trinta) dias para a desocupação voluntária. Nesses casos, em decorrência da quebra contratual por parte do locatário, o Superior Tribunal de Justiça entendeu, em recente julgado (REsp 1.906.869), que é plenamente possível a cobrança da multa compensatória pelo locador, ainda que que o imóvel não tenha sido voluntariamente devolvido por iniciativa do próprio locatário. Isso porque, não é razoável exigir ao locador que aguarde a boa vontade do locatário inadimplente em devolver voluntariamente o imóvel, para poder cobrar a multa compensatória prevista contratualmente, o que obstaria, inclusive, o pedido de despejo para reaver o imóvel, em manifesta afronta ao instituto criado pela lei para recompensar os prejuízos decorrentes do inadimplemento contratual. Em outras palavras, condicionar a cobrança da multa compensatória à devolução voluntária do imóvel pelo locatário inadimplente, apenas penalizaria o próprio locador, que não poderia se valer da medida de despejo, sob pena de não poder cobrar a multa contratual prevista. Justamente com base nessas considerações, que o STJ interpretou que a expressão “poderá devolvê-lo”, prevista no artigo 4º da Lei nº 8.245/91, não se refere apenas à devolução voluntária do imóvel, mas também às hipóteses nas quais a devolução ocorre de maneira forçada, em razão de ordem judicial. A decisão foi acertada no ponto, uma vez que foi a própria inadimplência do locatário que acarretou na devolução forçada do imóvel, se mostrando justa a cobrança da multa pelo locador, que não pode ser penalizado pelo descumprimento contratual da outra parte.

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A consolidação da aplicação do redirecionamento da execução fiscal em face da dissolução irregular de sociedade

Uma sociedade é encerrada de forma irregular quando seus sócios decidem por encerrar o negócio e ‘fechar as portas’ sem quitar suas pendências em relação aos tributos devidos, ou sequer formalizar seu encerramento. A partir daí, existia uma discussão interpretativa sobre as possibilidades de redirecionamento de execução fiscal pela Fazenda Pública, em face de circunstâncias específicas sobre 3 principais pontos: características do sócio, o tempo e modo da dissolução, e a situação à data do fato gerador. A partir de questões submetidas a julgamento do STJ, o órgão recentemente se posicionou sobre as matérias relativas ao caso, por partes, e encerrou o conflito! Assim, as teses firmadas deverão ser replicadas pelos tribunais de todo o Brasil. Em primeiro lugar, diante da controvérsia objeto dos REsps 1377019/SP, 1776138/RJ e 1787156/RS, elencados no Tema Repetitivo 962, o STJ firmou, em novembro de 2021, o que segue: “O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, não pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio que, embora exercesse poderes de gerência ao tempo do fato gerador, sem incorrer em prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos, dela regularmente se retirou e não deu causa à sua posterior dissolução irregular, conforme art. 135, III, do CTN.” Esta orientação segue muito o que já se encontrava pacificado em nossos tribunais. Contudo, vale destacar para melhor compreensão, que a orientação define, a exemplo prático, que apenas sócios ou administradores que permaneceram na sociedade à ocasião da dissolução, nestas circunstâncias, poderão ser alvos do redirecionamento da execução. Portanto, se presentes à data da ocorrência do fato gerador, mas desvinculados antes da dissolução irregular, não estariam presentes os requisitos ao redirecionamento. Superada esta controvérsia, restava ao órgão julgar mais uma questão, adiada na ocasião: outra controvérsia, de matéria correlata, objeto dos REsps 1643944/SP, 1645281/SP e 1645333/SP, elencados no Tema Repetitivo 981. Em síntese, definir se o sócio ou administrador, presente à sociedade quando encerrada irregularmente, só teria responsabilidade sobre a dívida se nessa posição à ocasião do fato gerador, ou mesmo que somente em sua dissolução. Então, em junho deste ano foi publicado o acórdão, definindo o posicionamento do órgão sobre a matéria, impondo a seguinte interpretação: “O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio, com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, conforme art. 135, III, do CTN.” É importante destacar os fundamentos utilizados para tanto, pois justificado em julgamento que, em sentido contrário, o redirecionamento da execução não alcançaria sua finalidade. Ou seja, a solução não permitiria a cobrança da dívida e a recuperação do crédito pela Fazenda – nem da sociedade, dissolvida irregularmente, nem da pessoa natural, sócio ou administrador, que não possui mais vínculo à sociedade.  Ainda porque, aquele que se retirou da sociedade, fosse na posição de sócio ou de administrador, sequer o fez necessariamente em razão da prática de qualquer ato ilícito. E, também pelo destaque a essa diferença, foi ressaltado que o redirecionamento se deve enfaticamente pela dissolução irregular. Portanto, consolidada a matéria, daqui em diante apenas sócio ou administrador que participou do encerramento irregular da sociedade poderá ser pessoalmente responsável pelas dívidas tributárias da sociedade.

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O dano moral da Pessoa Jurídica

Embora muitas pessoas não saibam, é plenamente possível que a pessoa jurídica também sofra dano moral e, em razão disso, seja indenizada. Isso porque, a própria legislação estabelece que a proteção aos direitos da personalidade também é aplicada às pessoas jurídicas e o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o assunto. Mas, afinal, quando e como ocorre o dano moral da pessoa jurídica? Em princípio, é importante destacar que as empresas possuem aquilo que chamamos de honra objetiva, o que, por sua vez, possui relação com seu nome, sua imagem, reputação e credibilidade no meio social. Ou seja, a honra objetiva é representada pelo julgamento que terceiros fazem a respeito da empresa. Exemplificando, sempre que alguém, de formar ilícita, gera prejuízo ao nome ou à reputação de determinada pessoa jurídica, dizemos que está ferindo sua honra objetiva e, assim, gerando dano moral passível de indenização. Contudo, de modo geral e segundo entendimento dos Tribunais, para que tal indenização ocorra, é essencial a comprovação de efetivo prejuízo à empresa. Ou seja, não basta que se comprove o ato ilícito praticado por terceiro. Há, porém, algumas exceções a essa regra, visto que, quando ocorre a violação ao direito de marca (ex.: falsificação de produtos) ou o nome da empresa é inscrito indevidamente em cadastro de inadimplentes, assim como quando acontece o protesto indevido de título, a comprovação do ato ilícito praticado por terceiro é suficiente para que este seja condenado a indenizar, sendo presumido, portanto, o prejuízo sofrido pela pessoa jurídica. Outra questão interessante diz respeito às mensagens difamatórias publicadas por consumidores em suas redes sociais. Nesses casos, quando o consumidor se excede, de modo que não apenas expõe seus pensamentos de forma crítica, mas sim causa injusta e relevante agressão à fama da empresa, é possível que seja condenado a indenizar, posto que, agindo desse modo, fere a chamada honra objetiva da sociedade empresária. Por isso, há necessidade de que cada caso concreto seja analisado por um advogado de sua confiança.

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